Impressiona o fato de que apesar do tempo transcorrido deste a publicação, o artigo é atualíssimo.
Leiam e comprovem.
Ten Cel PM Ref Herrera, o segundo da esquerda para direita
O GUARDA
DA ESQUINA
(Publicado
em O Globo, de 11/08/1986, pelo então Major PM Nelson HERRERA Ribeiro)
Assombrada
pela escalada da violência, a população passa a clamar, mais e mais, por
“polícia nas ruas”, como se a simples presença do “guarda” pudesse ser a
solução da criminalidade.
(…)
Competem à Polícia Militar as atividades de Polícia Administrativa (ou de
Segurança), preventiva, com o policiamento ostensivo, mantenedora
da ordem pública, enquanto à Polícia Civil devem caber as atividades de Polícia
Judiciária, repressiva, com o inquérito policial, auxiliar da
Justiça.
A
farda da PM vem sendo, propositadamente, confundida com seu emprego
operacional: a PM é instituição militar, mas atua como corporação policial.
Como
o efetivo nunca acompanha a explosão populacional, sacrifica-se o próprio PM
para atender ao clamor público. A escala tida como “a melhor” é de 24x48, que
significa de 60 a 72 horas semanais. Um funcionário público trabalha 40, um
bancário 30, um operário 44. E, na sua “folga”, o PM ainda presta depoimentos
em Juízo, recebe instrução no quartel, pode cumprir serviços extras, e tem
necessidade de “biscates” para melhorar seu salário, incompatível com os
rigores da profissão. Isso em qualquer dia, com qualquer tempo e sem hora de
largar: depende da substituição ou de encerramento de ocorrência policial,
muitas vezes, à espera de policiais civis ausentes da Delegacia. Assim, a
jornada mínima de trabalho do “guarda da esquina” corresponde à jornada máxima
permitida por lei a qualquer outro trabalhador brasileiro. Mas não há
problema: a PM não é fiscalizada pelo Ministério do Trabalho.
Por
outro lado, a administração militar permite a apuração sumária de
irregularidades, a par de rigoroso regulamento disciplinar, irrecorrível
judicialmente. De forma diversa do policial civil, que tem direito ao processo
administrativo e pode recorrer à Justiça. Ao PM também são proibidos quaisquer
movimentos coletivos ou manifestações reivindicatórias, mesmo que individuais.
Só o Comandante-Geral pode pleitear, mas este está nomeado em cargo de
confiança pelo Governador.
Ainda,
o PM está sujeito ao Código Penal Militar, além do Penal comum, mas os
crimes praticados na atividade policial são considerados comuns; não há foro
especial. São ainda comuns os crimes praticados contra o PM – mesmo em serviço, mesmo contra a farda –, e
apreciados, de início, pela autoridade policial, o delegado.
(…)
No processo de recrutamento e seleção, aproveitam-se os melhores candidatos,
evitando-se tráfico de influência e empreguismo político. Os candidatos a
oficiais (curso superior de 3 anos*) prestam concurso vestibular. Ainda
assim, como em toda sociedade humana, há desvios de conduta. A PM está sempre
excluindo maus elementos. Que outra instituição ou classe, no Brasil, tem
esse dinâmico processo de seleção e com tanta eficácia? Entretanto a
expressão “ex-PM” soa como verdadeira acusação, tamanha a conotação
depreciativa.
(…)
A formação do PM não passa ao largo dos parcos recursos e, em poucos meses,
tem-se nova turma de jovens PM, pronta a morrer na guerra conta o crime.
Indefesos e impotentes contra o crime organizado. Daí, o elevado número de
mortos e feridos. A assistência médico-hospitalar pode evidenciar (por simples
estatística, desde que honesta) a grande incidência de doenças psicossomáticas,
as “doenças profissionais”. A assistência social também é precária.
(…)
Certamente, sem falar em baixa remuneração e equipamentos obsoletos, esse
quadro nebuloso pode fazer com que o PM, um profissional de polícia, perca a
sensação da própria segurança, gerando natural desmotivação e contribuindo
no contexto do desempenho insatisfatório. A menos que só fossem recrutados
super-homens.
Mesmo
assim, estão eles nas ruas, a qualquer hora, com todas as circunstâncias
adversas, suprindo com sua coragem pessoal as deficiências do Governo e da
Sociedade, e suportando com resignação o desrespeito de todos.
São
encarados pelo povo, de modo geral, como “eles, os militares”. Para os
integrantes das Forças Armadas, o PM é considerado policial, militares são
eles. Para os integrantes da Polícia Civil, policiais são eles, que atuam como
Polícia Judiciária. E o “guarda da esquina” não tem tempo para parar e
discutir, porque trabalha muito e sob rigor militar. Sequer pode queixar-se
ao Bispo: ainda não foi criada a Pastoral Policial.
(…)
Apesar de tudo, parece bom ter um “guarda” na esquina: permite maior sensação
de segurança. Apenas é importante lembrar que todas as circunstâncias do
nosso policial são brasileiras, não se podem almejar resultados europeus.
Contudo, como aos verdadeiros responsáveis pelas causas e concausas da
criminalidade e aos culpados pelos males da nação, o cidadão comum não tem
acesso, mas ao “guarda da esquina” tem, o PM pode ver-se, de repente, como o
bode expiatório de toda insatisfação popular. É psicológico. Ao homem do povo
só interessam resultados imediatos: sua eficaz proteção policial. Com justa
razão, pois o cidadão é contribuinte e eleitor, tudo mais compete ao Governo,
nesse raciocínio simplório.
(…)
Notório que, a cada Governo, renovam-se projetos de “um novo PM”, “uma
Nova PM”. E, apesar de todos os esforços, os problemas imediatos do “velho
PM”, esse pequeno universo do “guarda da esquina”, ainda carecem de
soluções pragmáticas, administrativas, urgentes. Porque dele depende a
atividade básica de segurança pública: nele se refletem os resultados que a
população está a exigir.
Arrumar,
primeiro, a casa: instituir dinâmico e justo sistema de administração de recursos
humanos, paralelo a condições mais humanas de trabalho. Cuidar do
Homem (insumo básico) para melhorar o Serviço (Produto PM), enquanto se
buscam, ao longo do tempo, soluções institucionais quanto às atribuições de Polícia
de Segurança e de Polícia Judiciária. Afinal, “Direitos Humanos” é bombástico
tema muito em moda: fala-se disso, quase com exclusividade, para criminosos.
Talvez
assim, mesmo em contexto tão complexo, o “velho guarda da esquina” pudesse ser
compreendido. Talvez possam mesmo absolvê-lo. Então, no futuro, com a
estabilidade econômica, política e social da vida brasileira, desabrochasse
esplendorosa essa imagem das Polícias Civil e Militar, adestradas para suas
específicas funções, ordeiras, disciplinadas, atuantes, de ilibada reputação.
Como todos almejamos e que já 177 anos** de história da Polícia Militar
fazem “o guarda da esquina” merecedor.
OBS.:
(*) Atualmente 2 anos de duração, exigido ao candidato ser Bacharel em Direito.
(**) Em maio/2017, completar-se-ão 208 anos de criação
da Guarda Real de Polícia.
Juntos Somos Fortes!
CARO COMPANHEIRO CORONEL PMERJ PAUL,
ResponderExcluirUm texto lapidar,de tamanha clarividência,profético, de elevado conhecimento técnico profissional, do mais alto nível, claro, preciso e conciso, só poderia ser mesmo da lavra desse respeitável e respeitado OFICIAL SUPERIOR DA ANTIGA PMEG, ATUAL PMERJ, O TENENTE CORONEL NELSON HERRERA RIBEIRO, que conheci em 1970,quando ainda jovem Capitão, servindo na antiga e saudosa ESCOLA DE FORMAÇÃO DE OFICIAIS, tendo sido meu instrutor de Instrução Policial.
Na minha opinião sempre foi um entusiasta,lutador e vibrador pela causa POLICIAL MILITAR,e suas enérgicas e irredutíveis posturas que assumia, sempre dividiu opiniões: os que apoiavam e gostavam do seu discurso e aqueles que não podiam compreender o teor das mensagens e idéias que o bravo guerreiro HERRERA procurava transmitir, e a prova é o artigo que escreveu em 1986,há mais de 30 anos portanto, mas que ainda soa atual.
PARABÉNS MEU COMPANHEIRO MAIS ANTIGO TENENTE CORONEL PMERJ REF NELSON HERRERA RIBEIRO, EU TE SAÚDO.
PAULO FONTES TENENTE CORONEL PMERJ RR
E quem o sucedeu parece q nao aprendeu a licao. Ou entao preferiram o mike mike
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