1 de novembro de 2013
"CADÊ OS 200 MIL? ou UMA TRAGÉDIA DEMANDA UMA POSIÇÃO, MAS UMA POSIÇÃO JAMAIS DEMANDARÁ UMA TRAGÉDIA
Na semana que passou, este articulista foi surpreendido com duas notícias que apresentavam, na opinião deste que vos escreve, o mesmo DNA: primeiro, a de que o cantor e compositor Caetano Veloso havia postado, na rede social Instagram, uma foto da escritura da casa comprada para a família de Amarildo Souza, pedreiro desaparecido na Rocinha. Segundo, a de que artistas como Wagner Moura e Mariana Ximenes estava organizando um “protesto contra a criminalização dos movimentos” e particularmente contra a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro e seus 45 mil homens.
Por que afirmo terem, estas duas notícias, o mesmo DNA? Bom, não bastassem todos os motivos que vou abordar, lembro como foram as sequencias das duas notícias: no caso de Caetano, R$ 250 mil foram arrecadados para a compra de nova residência, sendo que R$ 50 mil foram para a casa em si e o restante para a “ONG de um advogado que vai financiar estudos sobre os desaparecidos”. Oxalá esta verba investigue um dos principais desaparecidos, que são os R$ 200 mil, no fim das contas. Depois, constatei que na tal manifestação convocada pelos artistas, ao que parece, faltaram…os artistas.
Nos dois casos vemos assim a presença do Catalisador, elemento químico que dá início a uma reação mas que não faz parte do resultado final – e que me corrijam aqueles que estão com a memória mais ativa para estes assuntos dos bancos escolares. Nos detendo particularmente no Caso Amarildo, vale, como oficial da Polícia Militar que não pratica o ato de tampar o sol com a peneira, reconhecer: ao longo de anos as Polícias no Rio mataram inocentes (não me cabe avaliar se é o caso do Amarildo, ainda que nenhuma morte se justifique), e ao longo destes mesmos anos acumularam mazelas, de modo que seria o auge da hipocrisia atribuir culpas exclusivas a este ou aquele governo. Também não é, racionalmente, justo dizer que cabe à PM o monopólio da morte de inocentes, como podemos ver nesta notícia de 2005 sobre a Rocinha, narrando a morte do adolescente José Ricardo. Desnecessário dizer que não houve nenhuma campanha em sequencia.
À parte o fato de que o crime contra o Amarildo foi realmente muito mais grave (por ter, segundo investigações, havido tortura), o que fez os artistas se mobilizarem tanto para este caso em particular, mesmo quando não havia a clareza que a investigação da DH nos trouxe posteriormente? Em que o desaparecimento do Amarildo é tão mais grave que outros milhares de desaparecidos – inclusive o do soldado Ribeiro Chaves, cuja família passa necessidades pelo fato de não poder ser concedida pensão porque não houve encontro de seu cadáver (apenas de massa encefálica e parte dos dentes). É mais grave? Pode ser. Mas aí é o X do Problema. Não foi a “gravidade” do caso que arrastou esta gente toda.
Façamos aqui um parêntese para lembrar que o Estado já está prestes a pagar a pensão para a família de Amarildo, esta mesma que ganhou casa. Ou seja, sem querer plantar rancores ou ressentimentos, fica claro que a opção de ajudar a família do Amarildo é tão somente devido ao fato de ter sido, supostamente, morto por policiais. Dificilmente haveria esta mesma solidariedade caso ele fosse morto por bala perdida entre facções rivais.
Ora, então, perguntaria o leitor, o foco de Caetano Veloso e sua família (procure saber) é tão-somente a PM? Sim é a resposta. Vamos aos motivos.
1- Caetano e os artistas-manifestantes querem se posicionar diante dos fatos:
a) A PM matou Amarildo
b) A PM é truculenta com os manifestantes.
Na verdade, resumindo, querem se posicionar contra a PM.
2- Caetano et caterva são solidários apenas com vítimas da PM, e não com PMs ou quaisquer outros tipos de vítimas da violência como um todo
3- Os artistas não pensam em analisar a fundo os motivos da violência porque precisarão abordar assuntos desagradáveis: concentração de renda, miséria, Estado falido (mas que mesmo assim alimenta as benesses artísticas e que mantém as isenções da Lei Rouanet). Assim sendo, esquecem a raiz e vão em uma das folhas: a PM. É mais retórico assim. Ora, bandidos não têm rosto ou instituição. Ser “contra bandido” é chover no molhado. Ser “contra a PM” é se posicionar em relação a um Estado e a um Governo
4- A maior parte dos artistas – inclua-se Caetano – tem interesse no caso do Amarildo porque se passou em UPP. Apenas isto. Como são ligados à oposição ao governador, vão aderir fácil a qualquer mazela que tenha partido de uma UPP. Claro, é a marca mais forte do governo na Segurança Pública – para eles, vale tudo na desconstrução.
5- Como sofisma, afirmam que a desmilitarização da PM é que resolveria o problema – curiosamente, nenhum deles faz análise de causas e consequências. Do mesmo jeito que não sabemos como o Militarismo atua enquando Causa da violência, também não vemos os artistas dizendo quais seriam as consequências da desmilitarização (uma delas, o pleno direito de greve)
No frigir dos ovos, percebe-se nestes artistas um desejo de se posicionarem politicamente contra a PM, o Governo e as UPPs. Mas para que este posicionamento tenha alguma relevância ou repercussão, para que haja empatia da população ou mesmo endosso de setores, é necessário que haja tragédias como a de Amarildo Souza, com capacidade de mobilização. Ou seja: não é errado afirmar que a morte de um favelado sob tortura veio a calhar para os planos dessa turma. Ao vermos o sr. Pablo Capilé (vá lá o que seja) exibir em rede nacional uma camiseta escrita “Cadê o Amarildo” (durante entrevista no Roda Viva) não vemos ninguém ter a curiosidade de perguntar: quem pagou pela camisa? Quantas foram feitas? Por que está sendo usada? Por que não exibem solidariedade por outras vítimas de violência policial (as há, meus amigos, as há)? Porque o homem Amarildo de Souza nas mãos de todos estes senhores é uma marca. Fazem a gestão desta morte do mesmo jeito que o McDonald’s inclui saladas no cardápio ou a Coca-Cola retira o excesso de açúcar de sua fórmula. A morte é um business. Lembremos que este business gerou R$ 200 mil reais, para bancar um estudo que o Instituto de Segurança Pública já tem pronto. Mas, adrede, propagam o estudo de desaparecidos como se tal panfleto se tratasse da palavra definitiva sobre o assunto.
Tirando ligeiramente o foco do caso Amarildo (não totalmente) e passando para o caso das manifestações, observem os senhores leitores que há a reclamação contra a atuação da PM mas não há condenação contra os dias em que esta não atuou. Ora, para os artistas, portanto, casos como o do Leblon e da Avenida Rio Branco, em que a Briosa não pôde atuar, seriam os modelos ideais? Neste caso, a depredação e o vandalismo, a destruição da propriedade pública e privada não são fatores a serem registrados pelo protesto dos artistas?
É claro que não. Porque o protesto, ou melhor, os dois protestos não podem jamais serem encarados como iniciativas de gente séria. No caso do Amarildo, é mera cortina de fumaça para as estripulias que o sr. Caetano Veloso vem cometendo em relação às biografias não-autorizadas. No caso do manifesto dos artistas, apenas forma de criar outra cortina de fumaça – de um lado, a Globo faz as críticas (levíssimas) aos blackblocs, sempre atacando o uso de armas não-letais pela PM, claro. De outro, seus artistas e rostos identificados com o sistema fazem a apologia dos blackblocs. Assim, fica tudo em paz com todo mundo. Notem que no início da semana houve manifestação na porta da Globo no Jardim Botânico, com diversos transtornos para o cidadão da área, e a Globo não deu uma linha sequer.
Sendo assim, fico com a minha frase título: esta gente precisa de uma tragédia para adotar uma posição. Ora, vão lá e ataquem a PM diuturnamente. Critiquem. Ajudem a mudar. Entendam seus problemas. Mas não esperem uma tragédia. Uma posição verdadeira, um caráter, não precisa de sangue derramado – apenas de sangue correndo pelas veias.
Assim sendo, meus amigos, expliquem aos parentes e amigs paisanos: Caetano, Paula Lavigne e artistas revoltosos em geral deveriam ir lavar uma louça em vez de quererem aparecer às custas das tragédias da PM. Precisamos de líderes que nos ajudem a diminuí-las, precisamos de gente que queira trabalhar, que queira mudar tudo.
E não de alguém que torce pelo próximo Amarildo para ver confirmadas suas teses redundantes e sem sal. Uma tragédia precisa de uma posição, sim. Mas uma posição jamais precisará de uma tragédia. Pelo menos para quem tem honra".
Blog do Major Fernandes (o nome e a patente são fictícios)
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