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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

O DESAFIO DA PACIFICAÇÃO - IGNÁCIO CANO - COMENTÁRIOS

Revista Carta Capital

Prezados leitores, um artigo lúcido de Ignácio Cano, um pesquisador.
Quem ler esse artigo encontrará inúmeros aspectos do projeto que temos destacado nesse blogo e no blog "A biografia não autorizada das UPPs (Link)".
Nós sublinhamos alguns aspectos que consideramos de maior importância, mas o artigo como um todo é um dos melhores (mais verdadeiro) sobre as UPPs, inclusive por reconhecer a existência de uma crise no setor, algo que os especialistas governamentais não abordam.
O pesquisador citou um fato inédito em artigos fora do universo do nosso blog, trata-se da abordagem correta sobre a "focalização invertida" do projeto, ou seja, sendo implantado em regiões menos violentas e esquecendo as mais violentas.
O texto é esclarecedor e de leitura obrigatória.
Eis o artigo:
"O GLOBO
IGNACIO CANO 
Publicado: 28/11/13. 
A partir de 2009, o governo do Rio adotou políticas que contribuíram para a redução da violência letal, como as UPPs e as metas policiais por Aisps. As UPPs diminuíram significativamente as mortes violentas nas comunidades, na medida em que interrompiam a disputa pelo território, ao tempo que enfraqueceram o controle territorial dos grupos armados. Entretanto, as UPPs são ainda mais importantes como uma oportunidade de transformar o paradigma da segurança pública, deixando para trás o modelo nefasto da guerra ao tráfico e se aproximando de uma visão de segurança que priorize a proteção das pessoas e a preservação da vida. 
Como era de se esperar, essa transformação tem enfrentado resistências e contradições, inclusive porque seus gestores e participantes são os protagonistas do velho modelo. Assim, o mesmo Bope que ocupa as comunidades a serem pacificadas sem disparar um tiro é o que, em resposta à morte de um dos seus integrantes, deflagra uma operação de vingança na Maré com numerosas vítimas. E as polícias que dizem apostar na pacificação são as mesmas que atiram indiscriminadamente dos helicópteros, como no caso do bandido Matemático. A despeito do discurso do secretário contra a “polícia da guerra”, a condução do processo não tem sido firme ou clara nessa direção. Assim, crises em várias UPPs têm tido como resposta o retorno ao modelo do Bope, tanto nas pessoas quanto nas doutrinas, na convicção de que são os “policiais operacionais” os que resolvem. Em várias UPPs, policiais continuam sendo premiados com dias de folga quando fazem flagrantes de drogas, em vez de incentivar a prevenção.
O momento atual das UPPs é de crise, em parte devida à própria expansão do projeto, que aumenta a chance de incidentes, e também a uma cobertura midiática edulcorada, que apresentou o projeto como panaceia. Os últimos meses registraram mortes de moradores e policiais em várias comunidades e o Alemão nunca foi plenamente pacificado, para não mencionar o impacto do caso Amarildo, cujo corpo ainda não apareceu. O mais grave é que o impulso reformador parece estar se perdendo. Infelizmente, os avanços em termos de redução de letalidade e controle territorial são facilmente reversíveis se a polícia sair das comunidades. As mudanças potencialmente mais permanentes, que não dependeriam da continuidade da presença policial, seriam a reforma do modelo policial e a aproximação da polícia às comunidades, justamente as áreas de menor progresso. Por outro lado, a PM não sabe até hoje como integrará, em médio prazo, as UPPs com o resto da corporação, pois o modelo dual não pode ser mantido indefinidamente.
A conjuntura geral é preocupante. Após vários anos em queda, os homicídios se estabilizaram em 2012 e começaram a subir recentemente no estado, particularmente na Baixada Fluminense. A tendência positiva dos roubos também se inverteu. A impressão que resta é a de que as políticas atuais esgotaram o seu impacto positivo e que, portanto, é preciso mudar o foco de algumas e desenvolver outras. Assim, as UPPs apresentaram até agora uma focalização invertida, pois se concentraram nas regiões menos violentas do Estado e esqueceram justamente as que apresentam maior taxa de homicídios. Novas políticas para desarticular milícias e grupos de extermínio são necessárias. E a incorporação da Polícia Civil ao processo de pacificação é um desafio pendente. Num ano eleitoral, é improvável que o governo empreenda iniciativas ou assuma riscos, ainda mais num cenário de incertezas políticas e econômicas. Mesmo assim, é importante reagir, pois a janela de oportunidade é única. A próxima Olimpíada no Rio pode demorar mais de cem anos anos".

Juntos Somos Fortes!

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