Prezados leitores, a reportagem é de 2016, hoje nós a republicamos considerando que a triste realidade dos Policiais Militares no Rio de Janeiro piorou mais ainda nesse período de um ano da publicação da matéria.
"Revista Época
Vida de PM no Rio: desprezados, doentes e com medo
Malvistos pela população e caçados pelos criminosos, os policiais militares do Rio de Janeiro estão abalados como soldados em guerras e mais suscetíveis a cometer erros fatais
HUDSON CORREA E RAPHAEL GOMIDE
04/02/2016 - 08h05 - Atualizado 04/02/2016 08h51
Todos os dias, na hora de sair de casa para o trabalho, Bianca Silva ouve o apelo da filha, de 9 anos. “Mamãe, você vai morrer?”, diz Maria, que, invariavelmente, chora e abraça forte a mãe. “Por que você não escolhe outra profissão?” Bianca é capitã da Polícia Militar do Rio de Janeiro e, desde setembro de 2014, é toda a família que Maria tem. O pai, o capitão da PM Uanderson Silva, foi morto aos 34 anos durante um confronto com traficantes no Complexo do Alemão. Comandante da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) de Nova Brasília, a mais violenta entre as favelas incluídas no programa, Uanderson foi morto pela bala de um de seus soldados ao ficar no meio do fogo cruzado. Bianca passeava em um shopping quando recebeu a notícia de que o marido havia sido baleado. Antes de ir ao hospital, passou no batalhão para trocar o vestido pela farda, temendo que o ciumento Uanderson reprovasse o traje de passeio. Uanderson morreu antes que ela pudesse vê-lo. “Os danos psicológicos são inevitáveis”, diz Bianca. “O tempo inteiro nós convivemos com o medo de morrer.” Bianca não cogita desistir da profissão, apesar da tristeza da filha, que toma tranquilizantes e é acompanhada por psiquiatras da Polícia Militar.
Bianca e Uanderson se conheceram na academia de formação de oficiais da PM do Rio de Janeiro e trabalhavam na mesma região. Só no primeiro semestre do ano passado, policiais das UPPs do Complexo do Alemão e da Penha estiveram envolvidos em 260 tiroteios, mais de um por dia. Na favela Nova Brasília, o clima entre policiais e moradores é de animosidade. A polícia é tratada como mais um inimigo, não um aliado. Para amainar a situação, no passado Bianca considerou criar um programa de distribuição de presentes no Dia das Crianças. Mas o projeto minguou, segundo ela, pela resistência da população local. “Sentia o medo das crianças em falar comigo”, diz. “Elas crescem com a visão de que o policial é violento.”
É comum entre os PMs a percepção de que a população sente medo, repulsa e até certo desprezo por eles, como mostra a pesquisa UPPs: o que pensam os policiais, feita recentemente pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes. Para a maioria dos policiais entrevistados, os sentimentos dos moradores em relação a eles são de ódio, raiva, aversão, desconfiança, resistência e medo. O cabo Rodrigo Cunha sentiu isso nas vielas do Morro São Carlos, onde uma UPP foi instalada em 2011. “Existem lugares em que o Estado está lá de intruso”, diz. “Você dá bom-dia à criança e a mãe vem correndo levá-la embora. ‘Não fala com polícia.’ Acham que seria melhor se nós não estivéssemos lá.” Comerciantes se recusavam a vender garrafas de água a Rodrigo e moradores cuspiam no chão quando ele e os colegas passavam.
Barbaridades cometidas por alguns PMs ao longo dos anos, como tortura, agressões, execuções de inocentes e fraudes para camuflar assassinatos a sangue-frio, criaram essa rejeição em parte da população. Para ficar em um exemplo rumoroso, desde julho de 2013 não se sabe o que aconteceu ao pedreiro Amarildo, que desapareceu depois de ser levado para a sede da UPP da Rocinha. Vinte e cinco policiais da unidade são acusados de participar da tortura, morte e do sumiço do corpo. Nesta semana, oito PMs foram condenados. Chagas como essa não apenas não cicatrizam, como contaminam a rotina dos policiais que trabalham direito. ÉPOCA entrevistou militares, levantou estatísticas e teve acesso a pesquisas inéditas sobre a situação-limite em que vivem os policiais do Rio de Janeiro, como mostram os quadros desta reportagem. Os policiais têm índices piores que a média da população de doenças causadas por sedentarismo, sentem-se desanimados, com medo, e usam álcool, remédios e drogas. Os policiais sabem que são malvistos, sentem-se ameaçados e têm muito, muito medo de morrer – justamente por serem policiais.
O curso de formação de praças da Polícia Militar do Rio de Janeiro ensina os aspirantes a policial a agir, em todos os sentidos. Há algum tempo, entre as orientações eles aprendem a ocultar a profissão e sobreviver em uma cidade violenta, refratária a eles. Os policiais ouvem que devem usar o carro, em vez do ônibus, para ir trabalhar. Mais: devem esconder a farda no porta-malas ou no banco traseiro, sempre pelo avesso e dentro de um saco escuro. Todos os dias, o soldado Antônio Matsumoto, de 34 anos, passa cerca de três horas no trânsito para chegar ao quartel na Tijuca, na Zona Norte da cidade. Chegaria mais rápido se fosse de trem ou metrô, mas tem medo de assaltos: a farda na mochila pode ser uma sentença de morte, como foi em outubro para o sargento Fernando Monteiro, assassinado a tiros de fuzil quando assaltantes encontraram seu uniforme. Parceiro de Matsumoto no patrulhamento diário, Fábio Terto, de 33 anos, é obrigado a ir de trem para o trabalho. Depois de fardada e armada, a dupla vai de ônibus para o patrulhamento, uma novidade para aproximar os agentes da população. Matsumoto fica de pé na porta perto da catraca, com a mão na pistola, enquanto Terto se posta na porta traseira. A aflição é total. Ninguém olha para ninguém. Como eles, 81% dos policiais acham que vivem “em risco constante (Leiam a reportagem completa)”.
Juntos Somos Fortes!
E só acaba com as UPPS transferir para os bairros, igual ao centro presente,Lapa,meia,aterro presente será bom para os polícias,e os moradores das comunidades que não gosta dá polícia
ResponderExcluir